Em comentários aos amigos blogueiros, hoje já falei de transcedências duas vezes. Talvez mais, indiretamente. Sou, espiritualmente falando, uma Buscadora. Avessa às religiões de um modo geral, embora não tenha ficado livre de experimentar mais de perto um desses caminhos. Penso que na maturidade auto-refletida acabamos por retomar coisas que deixamos no meio do caminho, embora nos tenham sido caras algum dia. Falo isso lembrando que a Poesia foi, por assim dizer, meu primeiro Deus. Quando não acreditava em nada que estivesse além da minha limitação dos sentidos, quando Deus era apenas um nome, vislumbrei a transcendência através da Poesia. Casual e circunstancialmente, as primeiras poesias que li na vida eram de autores portugueses. Ler poemas foi, por muito tempo, o meu canal de comunicação com aquele Algo que, por mais que eu tentasse ignorar, falava secretamente à minha Alma. Com o tempo e a caminhada, Deus tomou várias faces, vários nomes... Um belo dia lembrei que a Poesia esteve por muito tempo preenchendo um espaço imenso na minha vida. Olhei esse Deus a uma certa distância e o vi desbotado. Timidamente, reaproximei-me. Surpreendentemente, tinha ainda o mesmo brilho de antes. Escrevi há pouco tempo, no blogue do Leonardo, que a Poesia era pra mim (ainda) o melhor presente do mundo. E é. O comentário veio em face da homenagem, do presente, que, agradecida, compartilho com os amigos, e que pode ser lido também no http://abarcadosamantes.blogspot.com/.
Pela palavra que nos une no traçado do vento,
À Tânia regina Contreiras
(Leonardo B.)
Há, na tinta onde cada mão se faz traço
Uma das duas águas dum cântico terreno.
Por cada Lua que ilumina, e onde
Por cada astro que a noite cedeu
Em forma de candeia, eu
Encontro um anjo disposto a florir
Um pouco de eternidade
Em cada escora da minha terra plana.
Há, por cada sombra que me sobeja
Um pedaço de corpo que no chão se prendeu,
O mínimo projecto de cinza que se amotina e reclama
O que nenhum vento se dispõe a soprar,
Como se o tempo, abóbada de terço
Em granito, se vertesse água mole
Numa janela, a pedra impossível em dupla fresta,
Arco quebrado virado para todas as latitudes
Que escoram cada corredor da minha terra plana.
Há, por cada palavra uma raiz
Que me resguarda o do que de mim em mim
Revelado no nervo dum espelho baço,
Se revela vago e fútil.
Triste é a palavra inútil, a que se esconde em
Radiografia menor e forma, que o meu céu portátil esconde,
O eu recluso que se alimenta da madeira que sustenta
Cada escora da minha terra plana.
Há, na sombra que me esconde a matriz
Um plano, um rascunho de hemisfério
Que me conduz nessa tempestade menor,
Do tempo a bissectriz.
O mínimo mundo, onde acontecendo,
No compromisso da manhã me esqueço que
Por vezes, já sou o que em projecto teimo,
O que digo e faço:
Um dia em tinta permanente
Onde cada mão se faz traço!
29 comentários:
TEM SELINHO NOVO PARA VC NO MEU CANTINHO OK BJOS
A Poesia, assim escrita (em maiúscula inicial),
transforma em pó e anestesia a desnotícia do jornal,
Poesia, és caminho e chegada,
que fatia meu carinho pela estrada.
transcender - buscar
eis o caminho roto da existência, o palpitar das celebrações,
beijo
Encontrar alguém ( um anjo)...As sombras mostrando que ainda está preso ao chão...Descobrir-se que muitas vezes já se é o que se persegue...Perfeito... O Poeta em criação reconhece a sua poesia ligada a sua terra/vida. Parabéns por merecer um presente tão rico e multifacetado para inúmeras reflexões.
Ave nave!!!
Já havia lido a homenagem lá. Muito bonita. Prazer vir parar aqui.
Abraços.
Belíssima homenagem...
Gostei muito da sensibilidade em seu texto..
abraço e agradecido pelas visitas ao Rembrandt
Taninha, querida
Bom voltar a sentir o perfume das suas violetas!
Que nossa semana seja de transcendência e inspiração!!
Beijinhos e até 6a
Tânia, ser buscadora e estar sempre aberta, sempre disposta a abraçar aquilo que encontra a alma. Te vejo bem assim, sem limites ou fronteiras que te aprisionem.
A homenagem é merecidíssima, e Leonardo é um poeta gigante nos versos que oferta a quem o lê.
beijos
Um presente assim é dádiva de corpo inteiro, das mãos ainda a escorrer a percepção dos ventos e das marés...
Para guardar lá bem no fundo!
Bjs
tânia, "sou uma buscadora". essa é das frases que, ainda que posta por palavras com nuances, mais agarrei nos últimos anos. veio-me parar às mãos no belíssimo (e já vetusto) filme italiano "mediterrâneo"; é dedicado a todos os que não cessam de procurar. procuremos, sempre, pois.
um beijinho!
Márcia e Carlos, obrigada pela presença e pelo selinho.
Abraços,
Tânia
Hélcio, é desta Poesia com "p" miúsculo de que falo mesmo. Grata pela visita.
Abraços,
Tânia
Olá, grande Assis, obrgada pela visita!
Abraços,
Tânia
Maria Emília, Bípede, Lara, Juan e Caludinha, obrigada, queridos, pela visita. Um abração pra vocês.
Tânia
Ô Tânia, eu vi. Fiquei feliz porque significa que de alguma forma consegui traduzir um pouco do Roxo-violeta. Então, de fato, o poema se fez cor.
Agora, o poema do Leonardo excede de bonito! Não li ainda a entrevista dele no Bloco de Notas, esse tempo que não basta! Mas chego lá.
Abraço carinhoso.
Parabéns pelo presente!
A poesia se mescla,
de fato,
ao divino...
Um beijo,
doce de lira
Lindo, muito lindo !
Acho uma beleza o fato de um poeta talentoso reconhecer o talento de outro, a ponto de homenageá-lo... É o que se passa aqui, felizmente.
Estou encantada!
Beijo
Marquinho, o poema traduz tanto a alma do Roxo-violeta que precisava, sim, ir para o perfil, e eu toda orgulhosa dele (o Ferreira Gullart haveria de entender por que saiu de lá...rs).
E, sim, lindo o poema de Leonardo, e eu fiquei feliz com o presente, sempre o melhor presente são versos, veja lá pra onde foi o que
ganhei para o Roxinho! :-)
abraços,
Tânia
Renata, acabei de conhecer o seu espaço e adorei o poema certeiro, direto, grata pela sua visita, querida!
beijos,
Tânia
ô, Zélia, sem dúvida bela homenagem do Leonardo, mas quanto a mim....lembro do Marquinho (cujo questionamento não procede, mas pra mim tá valendo, sim): e serei poeta? :-) Acho que sou, sim,uma amante, e um tanto relapsa, da Poesia.
beijos, querida!
Tânia
Amei seu cantinho...
Bjok
Oi, Débora, já estive no seu também, há pouco, e deixei lá os meus agradecimentos pela sua visita, tá?
Beijo,
Tânia
Linda homenagem!
Presente mais bonito que esse, não sei... Coisa linda o que o Leonardo escreve, e por ser tudo pra você, é ainda mais linda que ele!
Lindeza de homenagem, Tânia!
Beijoca
[tentar todos os dias contrariar as desordens do mundo, instruídos pelo que Unamuno advertia que “Se é o nada que nos está reservado, façamos então com que isso seja uma injustiça"”, é o que o nos deve mover, ir mais além das margens que criamos dentro de nós; eis a luz que se procura como uma benção, esperando a cada momento a sua luz, mesmo que fraca... desde que brilhe o suficiente para ressuscitar uma palavra de cada vez e eis que cumprido o momento]
um incondicional,
e imenso abraço transatlântico, Tânia
Leonardo B.
Leonardo, já não há palavras que traduzam o que a tua escrita [sempre] desperta. Deixo-lhe também um grande abraço, amigo!
Tânia
Ah, Tania, que coisa mais linda! Um presente eterno. O Leonardo é um poeta imenso.
Bjs, querida, e inté!
tania em primeiro verso. prazer em conhcer este espaço, tambem acompanho a barca dos amantes e adoro.
deus é algo que me fascina, transitei sempre entre o crer e o ateismo, cheguei a estudar teologia e mais...porem o que mais me atrai é agforma como pode se ver deus hoje. sou menbro da rcc brasil. um grupo religioso que busca por algo novo. porem sou um daqueles homens que uniu a crença a poesia e dela não consigo me esquivar, o silêncio dos templos catolicos e das mesquitas é o memso silêncio que desejo que me habite, a solidão das imagens. Deus é tudo porque podemos ver tudo nele. ainda que para muitos nada exista.
saudações.
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