Não, amar não, que amor exige entrega e entregar-se é morrer. Não é? Engano seu. Na entrega do amor – profunda, verdadeira – você deixa de existir enquanto ego, desata o laço que o prende com segurança e cai em vertigem interminável. Morre.
Quando ele me falou que sonhou com seu próprio velório e ressaltou que eu estava presente junto ao seu corpo, sorri por dentro, porque compreendi. Amar era o seu maior medo. Ele não sabia, porque esse quase terror estava mergulhado nas águas escuras do seu inconsciente e as feridas que o fizeram temer o amor vinham de muito tempo, da infância sofrida, quando lhe ensinaram a rimar amor com dor.
O corpo, ele entregava em êxtase. O coração jazia sob os escombros do passado. Um dia, desprevenido, afrouxou o laço que o mantinha seguro e sentiu um arrebatamento íntimo, como se lhe faltasse o chão, como se seu próprio corpo se fundisse com o outro corpo, e a respiração denunciou um algo desconhecido. À noite sonhou que morrera, e eu estava lá, acompanhando o corpo sereno, descansando na mesa, entre flores e lamentos.
Sim, amar e morrer são verbos que se irmanam. A metáfora do sonho escondia o começo de uma entrega, incipiente, a algo que parecia ser amor. Temeu, no entanto. Não à morte, mas ao amor. E recuou.
Um dia – assim desejo e espero – haverá de morrer sem medo.
2 comentários:
(os sonhos são como cometas:
cheiram ao fundo do corpo
onde em tempos se reconheceu asas e colinas de fogo
para logo se despedaçarem no chão
a que a morte deu o nome de amor).
há uma morte escondida na quitina dos desejos. só o tempo a desvela.
beijinho!
morrer sem medo,
quem dera,
vamos morrendo
sem quimera
beijo
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